Se tudo o que você quer para suas férias é uma praia deserta, um vilarejo simpático e um lugar com astral de paraíso ainda não descoberto, você deve ir para Boipeba, na Bahia. Mas esqueça o carro, pois Boipeba fica em uma ilha (ao lado de Morro de São Paulo) e lá só se chega de barco, a partir das cidades de Valença, Graciosa e Torrinha; ou em táxi-aéreo, em um voo de 35 minutos a partir de Salvador.
Apesar da proximidade com a agitada Morro de São Paulo, da qual está separada apenas pelas águas do Rio do Inferno, Boipeba é pura tranquilidade e ainda preserva um jeitão rústico e uma espetacular sequência de praias cinematográficas cobertas por um manto verde de coqueiros e manguezais. É um lugar para se desligar, passar o dia de chinelos e curtir a natureza à beira-mar longe de agitos e multidões.
A preservação das praias de Boipeba deve-se não apenas ao isolamento, mas também a uma imensa fazenda comprada por um italiano na década de 1980 que ocupa 40% da área da ilha. Diversas praias têm a cerca da fazenda no entorno, o que impediu a especulação imobiliária e a construção de casas e condomínios à beira-mar. Assim, Boipeba manteve suas praias quase tão intocadas como eram décadas atrás.
No principal povoado da ilha, a Velha Boipeba, pouca coisa também mudou nos últimos tempos. É verdade que o calçamento das ruas chegou há cinco verões, mas a vila, de apenas 3 mil moradores, continua pequena e simples como sempre foi. Você pode caminhar ali dando bom dia a quem passar que ninguém vai achar estranho. Carros não há porque não podem entrar na ilha. O único meio de transporte local são as charretes, que levam os produtos que chegam no cais aos mercadinhos; ou o trator da prefeitura, que recolhe o lixo das casas pela manhã. Nem praça Boipeba tem, só um gramadão mal cortado que serve de campo de futebol para a molecada no fim da tarde. A única coisa a fazer na vila é subir ao Mirante do Quebra Cu, no alto do morro, ou tomar uma gelada no bar do Jorge Som, na esquina da tal praça. A vila é sossegada, sem vocação para festa ou balada.
O outro vilarejo ilhéu é Moreré, a 7 km de distância de Velha Boipeba. É uma comunidade de pescadores bem acanhada, mas que conta com pousadas e alguns restaurantes comandados pelos nativos. Ir de uma vila a outra, porém, não é tarefa simples. O deslocamento se faz em tratores que rebocam uma carroceria com bancos para levar passageiros e circulam por uma estrada de terra miserável, parcialmente alagada na maré alta, quando um rio enche e derrama as águas no caminho. Leva uns 20 minutos chacoalhando sobre o trator e que só com lotação de seis pessoas.
Por conta dessa inusitada equação, a forma mais usual para conhecer as praias de Boipeba é caminhando. Da vila de Velha Boipeba até a Praia da Bainema, no sul da ilha, são 8 km, que podem ser percorridos em uma hora e meia de caminhada, passando pelas praias de Tassimirim, Cueira e Moreré. É uma das caminhadas mais lindas que você pode fazer em toda a costa do Nordeste. Muita gente faz esse percurso e retorna nos tais tratores-táxis a partir da vila de Moreré.
As praias de Boipeba
Boca da Barra é a praia mais próxima da vila e da maioria das pousadas. Pela proximidade, costuma ser a mais frequentada. Fica bem na foz do Rio do Inferno, tem grandes barracas, frescobol, vôlei de praia e castelinhos. Mas é a menos fotogênica da ilha.
Da Praia de Boca da Barra parte o divertido passeio de caiaque pelo manguezal do Rio do Inferno, uma boa maneira de interagir com a natureza da ilha. Os grupos saem a partir das 16h e seguem até o começo da noite, com uma parada para ver o pôr do sol no meio do rio. É um grande barato navegar por entre os túneis verdes dos manguezais. Dá para nadar e tirar fotos no desembarque em uma prainha. Ao escurecer, é possível observar o fenômeno da bioluminescência do plâncton nas águas do rio. É curioso: ao agitar a água, pontos de luzes se acendem ao montes, feito vaga-lumes. Quem leva: Agência Ecomar – (75) 99295-8858.
Se quiser conhecer a tranquilidade e a essência da paisagem de Boipeba é só caminhar um pouco mais. Fazendo a curva na foz do rio, uma trilha na mata leva à areia da Praia de Tassimirim. O primeiro trecho tem muitas pedras, onde os nativos pescam polvo na maré baixa, até seguir vazia e sossegada. A barraca Tassimirim, com mesas à sombra de uma amendoeira, serve a moqueca de camarão (R$ 120) mais famosa da ilha. Dona Antonina, a proprietária, diz que o segredo do prato é o camarão fresco. “O sabor é outro, diferente do congelado”, garante. O jeito então é tirar a prova.
Na vizinha Praia da Cueira, extensa e cercada pelo coqueiral, está a Barraca do Guido, o sujeito mais conhecido de Boipeba, que serve a lagosta grelhada no fogo de palha de coqueiro. Há mais de 30 anos, Guido começou a grelhar as lagostas, que ele mesmo pescava, em um quiosque pequenino à sombra da amendoeira. Naquele tempo, no fim do expediente, Guido guardava as mesas no alto da árvore para a maré não levá-las. Mas o tempo passou, os turistas começaram a chegar e Guido prosperou. O restaurante hoje tem uma grande estrutura com dezenas de mesas espalhadas sobre um deque de madeira e a areia da praia. No verão, chega a ter espera com tantos turistas. Mas Guido continua firme por lá grelhando as lagostas no fogão ao ar livre, à sombra da mesma amendoeira onde tudo começou. Virou até celebridade. Bate papo e adora fazer fotos com os clientes na mesma camaradagem de sempre.
No final da praia da Cueira, as águas do Rio Oritibe, que batem na altura do joelho, a separaram da vizinha Praia de Moreré. Ali, os arrecifes tornam o mar calminho e cheio de piscinas naturais. É o ponto de parada das lanchas que vêm em passeios desde Morro de São Paulo. Para comer, vá à Barraca Paraíso, que serve uma deliciosa moqueca de polvo, ou siga aos quiosques em frente à vila de Moreré, que é decorada pelos barcos de pesca tombados na areia no período de maré baixa. Nos quiosques, a bebida típica é a caipiroska de cacau com biribiri, uma fruta local ácida feito limão.
Já a Praia de Bainema, separada de Moreré por um manguezal, é a mais extensa e deserta, com 4 km sem qualquer infraestrutura em suas areias. É um local para caminhar e contemplar a amplidão de um cenário cada vez mais raro de ser encontrado no concorrido litoral da Bahia. A praia termina em um trecho de mangue de onde saem os caranguejos que vão parar no catado, prato típico preparado com a carne do crustáceo que encorpa um ensopado servido em panela de barro. Na maré baixa, é possível caminhar pelo meio do manguezal por um caminho de areia que segue da Praia da Bainema até as margens do Rio Catu. É um cenário bonito e intrigante em meio às grandes raízes aéreas do mangue.
Já no extremo sul da ilha está a Praia dos Castelhanos, a mais bela de Boipeba. Selvagem e isolada, quem vai até lá geralmente está a bordo das lanchas que fazem passeios, já que são quase três horas de caminhada desde a vila de Velha Boipeba. No caminho, as lanchas ainda param para mergulho nas piscinas de Moreré e um guia acompanha a caminhada pelo manguezal de Bainema.
O melhor do passeio, porém, é curtir a Praia de Castelhanos, que tem águas calmas, com trecho de rio e de mar, além de um amplo coqueiral imerso em uma área de proteção ambiental. As únicas construções do local são barracas de bambu que servem pastel de lagosta, siri, polvo e caranguejo. O sossego é total. Quem quiser caminhar pela areia vai encontrar uma praia sem fim.
Os passeios de lancha também levam à praia da Cova da Onça, com parada para mergulho nas piscinas naturais de Moreré e em Castelhanos. Faz parte de um roteiro conhecido como Volta à Ilha. Quem leva: Agência Coco Dendê – www.agenciacocodendeboipeba.com.br, (75) 99848-6650.
Boipeba é assim, linda e sem frescuras, uma pequena amostra de como era a Bahia antigamente, um lugar perfeito para liberar seu lado bicho-grilo, embora já existam excelentes pousadas na ilha.